Desrespeito à vida: a tragédia que revela a falta de infraestrutura e responsabilidade no Brasil

O Brasil é um país de contrastes profundos, onde a grandiosidade das cidades e o imenso potencial de seu povo são muitas vezes ofuscados pela precariedade das condições em que vive grande parte de sua população.
Uma tragédia recente, que abalou o país e deixou um rastro de dor e indignação, é apenas um reflexo de um problema estrutural que perdura há décadas: a negligência com a infraestrutura e a ausência de responsabilidade das autoridades públicas.
No epicentro dessa catástrofe, surge a pergunta que não quer calar: até quando vamos permitir que a falta de compromisso e o desrespeito à vida humana continuem sendo a marca registrada de nosso desenvolvimento?
Tudo começou como uma simples passagem rotineira, uma ponte que era parte do trajeto diário de tantos trabalhadores, estudantes e cidadãos que se deslocavam sem pensar muito naquilo que sustentava seus passos.
Mas, como um sinal de alerta, um vídeo que circulou poucos dias antes do desastre mostrava a estrutura da ponte já se abalando. A fresta já estava aberta, e o peso de anos de descaso só aguardava o momento certo para ser cobrado.
E foi no pior momento possível: o desabamento da ponte, que trouxe consigo não só vidas perdidas, mas uma ferida profunda na consciência coletiva de todos os brasileiros.
A ponte, que antes parecia um simples trecho do caminho, foi a protagonista de um drama que revelou um cenário mais amplo e sombrio. Não apenas de incompetência técnica, mas de uma falha sistêmica na gestão de nossas infraestruturas.
Há anos venho, junto com meus colegas, alertando sobre o abandono das grandes obras de engenharia do país, que muitas vezes vivem à margem da fiscalização e da manutenção preventiva.
O descaso é tamanho que sequer sabemos com precisão qual é o estado real de muitas dessas estruturas, uma vez que não há cadastros atualizados e pouco se faz para garantir que as condições de segurança sejam monitoradas com rigor.
A frequência das vibrações causadas pelo tráfego, seja de veículos rodoviários ou ferroviários, pode ser um fator determinante para a vida útil de pontes e viadutos.
Cada estrutura tem uma frequência natural de vibração, e quando as cargas externas coincidem com essa frequência, ocorre uma ressonância que pode amplificar as vibrações, com consequências catastróficas.
Já fazia tempo que esse tipo de risco deveria ser monitorado de perto, mas, como sempre, as autoridades preferiram ignorar o óbvio e seguir com a velha lógica de "tocar o barco até ele afundar". E foi o que aconteceu.
O vídeo que antevia a tragédia, com sua imagem inquietante da ponte já comprometida, simboliza o desprezo pela vida humana.
É uma representação clara de como o Brasil trata suas infraestruturas: como se fossem apenas números frios em relatórios, e não elementos vitais para a segurança e o bem-estar das pessoas.
A negligência foi evidente não só por parte dos gestores responsáveis pela manutenção, mas também pela falta de uma cultura de prevenção que deveria ser a base de qualquer planejamento sério em um país de dimensões continentais.
Estamos diante de uma falha estrutural em nossa sociedade, onde a vida humana parece ter pouco valor diante de interesses maiores, sejam eles financeiros ou políticos.
Poucos se importam com o fato de que, em pleno século XXI, ainda não há uma base de dados eficiente que possibilite uma fiscalização adequada e que, muito menos, as tecnologias mais avançadas, como o Big Data, sejam utilizadas para prever falhas antes que elas aconteçam. No Brasil, a tendência sempre foi a de reagir após o desastre, e não de prevenir o pior.
Porém, a esperança não pode se perder. 2025 está logo ali, e com ele a possibilidade de mudança. Se realmente quisermos evitar que tragédias como a do colapso dessa ponte se repitam, é preciso dar início a uma revolução silenciosa, mas urgente, na forma como lidamos com nossa infraestrutura.
Utilizar as ferramentas disponíveis, adotar a tecnologia de ponta, e, acima de tudo, mudar a mentalidade que ainda insiste em enxergar o problema como algo distante, que "não nos afeta diretamente".
Até quando vamos ignorar as lições da dor? O Brasil precisa urgentemente parar de agir apenas após o dano e começar a olhar para o futuro de maneira mais responsável e humana.
* Oelton Medeiros residente em Marabá (PA). É pedagogo, escritor, poeta, técnico em edificações, eletrotécnico, acadêmico em Engenharia Civil e agente fiscal do
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